Monday, May 30, 2005

AOS CORRUPTOS (3º ato)

QUANTO É O BASTANTE?


EDMILSON SANCHES

O jornal O Dia, do Rio de Janeiro, faz uma reportagem sobre corrupção e conclui que R$ 690 BILHÕES saíram dos cofres públicos, surrupiados pela corrupção.
O ex-ministro Aníbal Teixeira, em seu livro Reengenharia no Governo, também faz as contas: anualmente, o Brasil perde mais de 40 BILHÕES DE DÓLARES em corrupção e desperdício.
A revista Carta Capital, em 24 de julho de 1996, afirma, em texto de capa, que “a legislação em vigor favorece a corrupção” e abre a manchete, com grandes letras brancas sobre fundo negro: “ROUBEM À VONTADE”. (De 1996 para cá, portanto, nada mudou...).
Por sua vez, a Transparência Brasil anunciou, em abril de 2004, os resultados de pesquisa realizada entre empresas privadas sobre corrupção no país. Os resultados são de doer. Veja alguns deles:
a) cerca de 70% das empresas afirmam gastar até 3% de seu faturamento com o pagamento de PROPINAS. Para 25%, esse custo situa-se entre 5% e 10%;
b) metade das empresas participam ou já tentaram participar em licitações públicas. Destas, 62% já foram sujeitas a pedidos de PROPINAS;
c) 21% das empresas afirmam que a CORRUPÇÃO é aceita sem qualquer contestação.
Televisões utilizam microcâmeras e em diversos pontos do país flagram políticos em atos vergonhosos de recebimento de dinheiro vivo ou acertando propinas em atos claros de corrupção.
Agora, mais uma vez, os grandes veículos nacionais de comunicação trazem o assunto em destaque.
As televisões mostram a nojeira dos escândalos dos políticos bandidos (ou bandidos políticos?) em Rondônia, Alagoas, Brasília...
As revistas Veja e Época dão capas falando de políticos e corrupção como uma só e mesma coisa; são, no dizer das revistas, uma "praga", "deputados chantagistas, prefeitos ladrões e funcionários públicos desonestos"...
Tempos atrás, a Veja trouxe uma capa com ilustração que mostrava uma saúva alimentando-se de uma cédula de 50 reais. No texto: a “corrupção e inépcia nas prefeituras desviam MAIS DE 20 BILHÕES DE REAIS POR ANO”. O título é bem apropriado: “UMA PRAGA NACIONAL”.
Quanto é o bastante para esses prefeitos, deputados, políticos com mandato e funcionários públicos se contentarem e largarem de roubar o povo?
Quanto é o bastante para os políticos ficarem podres de ricos, comprarem seus carros, suas fazendas e lojas, ampliarem seu patrimônio em geral?
Quanto é o bastante em gente morrendo por falta de alimento, saúde, segurança, pois que o dinheiro para isso está sendo desviado?
O pior câncer do Brasil não é o de medula óssea nem o de próstata nem o de útero ou de mama. É o câncer moral, a falta de caráter, o cinismo e a hipocrisia associada à arrogância e à impunidade. Tudo isso junto forma uma gosma eticamente imunda, uma meleca moralmente podre, pregando-se e sujando as nobres funções públicas de administrar o bem comum, o bem para todos.
Quanto é o bastante para o descaramento político?
Quantos “esquemas” imorais, quanto mau uso da Imprensa, atormentada pela sedução de um patrocínio, uma publicidade, enfim, uma verbinha, um dinheirinho a mais?
Quantos fingimentos na tela... Quantos acumpliciamentos nas colunas de jornais...
Quanto é o bastante para essa contaminação viciosa da política ser abandonada e o jornalismo ressurgir como “quarto poder” e não como “quarto do poder”?
Por que os que, no início de sua história, que não tinham nada e hoje têm muito, por que sequer agradecem a Deus, e ainda querem mais, roubar mais, poder mais, corromper mais?
Quanto é o bastante? A quem pensam que estão enganando? Todos sabem que eles são corruptos...
Quanto é o bastante para ser feliz?
Quanto é suficiente para dedicar-se um pouco ao outro e auxiliá-lo na busca da própria felicidade ou na redução de suas necessidades?
O prefeito ladrão, o político corrupto, estes são os piores bandidos de uma nação. São genocidas, matam em grande quantidade. Esses devem ir para o nono e último nível do inferno, pela classificação de Dante Alighieri.
Todos os desastres, estragos e mortes por causa de buracos nas estradas e nas ruas -- o culpado é o político que rouba.
Todos os olhares tristes de meninos do buchão, anêmicos, cabelos desgrenhados, com dedo na boca, remela nos olhos e catarro no nariz -- o culpado é o político corrupto.
Todos os analfabetos e alfabetizados que não sabem ler, entender e responder um simples bilhete -- o culpado é o prefeito ladrão.
Todo professor, médico, policial e militar mal-remunerado tem por carrasco um governante mal-intencionado.
Todo político é culpado do bem que não fez. Em vez de estar dando entrevista na TV, esse político deveria estar prestando depoimento na Polícia. Em vez de seu nome em placas de obras superfaturadas, deveria estar com o corpo em celas superlotadas. Em vez de estar em gabinete que é um luxo, deveria estar na cadeia que é um lixo.
Lixo moral e lixo material, enfim, juntos.

(edmilsonsanches@uol.com.br)

Sunday, May 29, 2005

AOS CORRUPTOS

NÃO ROUBARÁS


Edmilson Sanches


Quando perguntam à maioria simples do nosso povo sobre o que espera do próximo prefeito de sua cidade, a resposta vem de pronto: que ele, prefeito, não roube.
É assim, em cima da bucha e com o desconfiômetro ligado, que o povo manda o recado curto e grosso para quem pensa em se entronizar em uma das 5.560 vagas que a cada quatro ano são abertas para prefeito no Brasil.
Não roubar não é somente não roubar -- até porque o que ocorre mesmo, legalmente falando, não é roubo. Entretanto, as conseqüências da apropriação do dinheiro público são tão nefastas quanto a violência dos assaltos à mão armada, dos latrocínios (roubo seguido de morte). Daí o povo, na sua simplicidade, estar com a razão: quando prefeitos realizam engenhosas “operações” (i)licitatórias e artifícios contábeis, quando superfaturam preços, em conluio com empreiteiros e empresários de olhos grandes e alma miúda, o que está acontecendo é roubo mesmo.
Por mais silenciosa e sub-reptícia que seja, a improbidade administrativa transveste-se de latrocínio, pois o que é desviado do dinheiro que deveria ser público é, na verdade, desviado da boca que tem fome e sede, da mente que espera educação e do corpo que aguarda saúde. Cada buraco em uma rua tem seu correspondente rombo nas contas de uma prefeitura. Por causa e culpa dessa eterna fome dos “poderosos”, corpos humanos vão-se deteriorando, definhando, desmilingüindo, até a morte. Está criada uma nova tipificação penal: latrocínio político.
As mais recentes pesquisas reforçam o caráter mesquinho e bandoleiro da grandesíssima maioria dos nossos políticos, segundo o que pensa, estatisticamente, o povo brasileiro. Quase 100% dos políticos são considerados desonestos, para ficar em apenas um adjetivo, digamos, mais “educado”.
Se você não acha isso, talvez saiba dizer a resposta ao fato de o Brasil, com tanta riqueza que dizem que ele tem, continuar classificado como país de Terceiro Mundo (porque Quarto Mundo não existe).
Talvez saiba responder para onde vão os mais de 40 bilhões de dólares que anualmente somem em corrupção e desperdício neste País.
Talvez saiba dizer onde foram parar os quase R$ 700 bilhões de dinheiro público comprovadamente desviado, segundo levantamento feito pelo jornal O Dia, do Rio de Janeiro, em outubro de 2001.
Se o roubo, o desvio, o desperdício, a sonegação, a fraude e um sem-número de nomes para as bandalheiras de toda sorte fossem estancados (e não serão, infelizmente...), não existiriam hospitais nem escolas privadas e tudo seria de qualidade.
As altas somas que cruzam fronteiras e vão para o exterior são as mesmas cuja ausência criam crises ao deixarem de chegar ao interior, onde milhões de miseráveis pagam com a fome, a ignorância, a doença, a desesperança e com a própria vida o juro pelo dinheiro que não receberam.
Quem acha que o quadro não tem tintas tão fortes assim, não acredita quando, recentemente, o dono da maior empresa de auditoria declarou à imprensa que em mais de 80% das prefeituras do Brasil os recursos são roubados. Não acredita quando o próprio governo federal tem constatado que na maioria das prefeituras existe corrupção ou desvios graves.
Prefeito é servidor, não é patrão. Prefeito é funcionário do povo e não chefe dele. Precisamos de prefeito que se torne padrão -- e não de prefeito que seja, ou se torne, ladrão.
Quando o povo responde que o que querem ver é prefeito não roubar está dizendo que quer pessoa que tenha e exercite ética. Ética -- total, completa e absolutamente. A ética é assim uma espécie de base, de alicerce, de baldrame ou bastião, sem o que não se firmará de pé qualquer projeto eleitoral sério, qualquer construção política de vergonha.
É claro que também é desejável conhecimento técnico, tino administrativo, espírito de liderança, visão de futuro e, não é pedir demais nos tempos de hoje, alguma formação acadêmica. Mas isso tudo... com ética. Pois, sem o alicerce da ética, mais dia menos dia toda casa desmorona, todo edifício rui, todo prédio desaba, toda construção se destrói, toda casa cai...
Prefeitos ganham salários razoáveis. Se não ganham, peçam para a Câmara aprovar um melhor salário... Mas não roubem. Além do salário, prefeitos têm segurança, transporte, casa e comida praticamente pagos pelo dinheiro do povo, sem falar em verbas do Gabinete e coisa e tal.
Por que será que auditorias sérias nunca são realizadas e, quando o são, não são divulgadas e, quando o são, não há gente processada e, quando o são, não há ninguém condenado e, quando o é, não vai pessoa alguma pra cadeia nem, tampouco, se sabe de dinheiro que tenha retornado?
Falando sério, leitor, está na hora de as pessoas de uma comunidade tomarem mais tino, terem mais coragem, sentirem mais vergonha e tomarem mais providências.
Os políticos sabem que, no Brasil, as pessoas, coletivamente, não têm a mesma disposição que seus vizinhos argentinos e outros sul-americanos.
Os políticos contam com a nossa covardia, com o nosso desencanto, a nossa preguiça. Desse modo, sem maiores ações e reclamações, o político desonesto vai flanando e se multiplicando.
Em época de campanha, pelo menos, quando lhe apresentarem as tais propostas ou programa de governo, saque do bolso um cartão, onde, à maneira dos Dez Mandamentos, estará escrito seu único pedido, sua basilar esperança, seu último grito: “NÃO ROUBARÁS”.

(edmilsonsanches@uol.com.br)

CARTA AOS CORRUPTOS

CARTA AOS CORRUPTOS

Edmilson Sanches

Brasil, maio de 2005.
Começo dizendo-lhes que estou meio sem opção acerca de qual vocativo usar no início desta carta. (Se não sabem -- até porque suas preocupações giram é em redor dos números, do dinheiro, e não das letras --, vocativo é o modo como se chama, como se trata alguém no começo de uma correspondência).
Seria um contrasenso chamá-los "Excelentíssimos Senhores Corruptos". Igualmente, não pegaria bem "Ilustres Corruptos". "Prezados Corruptos", então... - seria a maneira mais simples, embora, da mesma forma, inadmissível. Qualquer palavra a mais, um oxímoro, um paradoxo.Na verdade, vocês são apenas o que são: corruptos.
Não adianta o esforço de mídias compradas, os discursos e trejeitos e encenações. Não interessa que famintos de comida e pobres de consciência os louvem. Importa tampouco se vocês são as peças principais ou acessórias/"assessórias", se apenas "preparam o terreno" e fazem o "jogo sujo", para manter o emprego ou partilhar uma porção infinitamente menor do saque, da pilhagem, do butim. Nada importa. No fundo, na alma, em essência, todos vocês são apenas isso: corruptos.
Fiquem sabendo: corrupção é defeito de personalidade. Ou melhor, é ausência dela. O corrupto se acredita no direito de possuir o que não é seu. Ele furta, ele rouba, mas nem por isso ele é propriamente um gatuno ou um ladrão (repetindo, ele não passa disso mesmo: é, tão-só e para sempre, um corrupto).
Não importa se suas ações são ou não do conhecimento de outros ou se haja ou não sentença definitiva da Justiça: o corrupto sabe que ele não presta, que ele não é um modelo, que ele não adiciona valor, embora subtraia rendas. Ele sabe que é um corrupto. E para o mais Supremo de todos os tribunais, é o que basta.
Vocês, corruptos, elaboram mil e uma desculpas públicas, tentam iludir o próprio sentido e consciência, mas em qualquer canto do cérebro de vocês tem pelo menos um dos 100 bilhões (gostaram do número?), pelo menos uma célula cerebral, um neurônio entre cem bilhões pululando com a informação gravada, como se fora uma placa interna e eterna, indestrutível: "Eu sou um corrupto". Sem falar que nem todas as pessoas (e elas são muitas e variadas em uma cidade e seis bilhões na Terra) se deixam iludir pelo carnaval e pantomimas que o cinismo, a amoralidade e a hipocrisia criam.
Enquanto escrevo estas maltraçadas linhas, vem-me à mente o vocativo menos inadequado para vocês: "Caros Corruptos". Porque vocês são caros mesmo. Manter a fome de dinheiro, a sanha por poder de vocês não é barato. Vocês arrombam cofres, maquiam contas, mascaram ações, forjam, falsificam, alteram documentos e adulteram pessoas, criam do nada e somem com tudo. Isso não quer dizer que vocês sejam "mágicos" ou "artistas"; são, apenas, corruptos. Este é o nome, este é o (des)qualificativo, esta é a pecha que, como carimbo na testa, como tatuagem na alma, vocês irão levar para o túmulo e deixar na História.
Todo corrupto é um criminoso, um assassino: rouba oportunidades, nega direitos, descumpre deveres e, até, mata mesmo. Quando podia alimentar mais, preferiu encher sua própria mesa. Quando podia empregar mais, empregou para si. Quando podia construir obras, construiu papéis. Quando podia produzir coisas, fabricou imagens. Para o corrupto, o valor das coisas está no preço das pessoas.
Vocês, corruptos, tinham opção. Não roubar. Não fazer "caixinhas" ou "caixas-2" com dinheiro alheio. Não produzir falsos testemunhos. Não ameaçar. Não intimidar. Vocês tinham opção. Entretanto, pelo poder do dinheiro e pelo dinheiro do Poder, preferiram render-se ao patrimônio, vender-se ao Demônio.
Não se sabe qual é a concepção de felicidade de vocês nem se vocês a procuram. De qualquer modo, felicidade é estado do ente (isto é, do ser), é uma condição da mente. Nos corruptos, isso muda para estado doente e condição demente.
Doença... Loucura... A sanidade moral e mental foi subvertida.
Corruptos: vocês estão ferrados. Mais dia menos dia, vocês vão pagar. Ah, se vão!...
Um dia a Imprensa deixará de ser tão "imprensada" (por vocês), a Justiça será mais justa, o Ministério Público será mais do povo e o povo será menos besta.
E se as leis e a coragem de quem as deveria manter não são suficientes, da lei natural os corruptos não escaparão: ela vergará seu peso sobre eles e eles, de bolso cheio e alma vazia, morrerão.
E a História inscreverá em lápide a sentença final:
"Aqui jaz um corrupto.
Sua vida não foi um exemplo para a sociedade; sua morte é um alívio para a Humanidade.
Pela imagem e semelhança que tinha, ele envergonhou a Deus.
Que Ele se apiade de sua alma.
Requiescat in pace."
(esanches@jupiter.com.br)